Ainda lembro como se fosse o dia de hoje. O dia em que recebi a notícia de que ganhei uma bolsa de estudo e que viria a Portugal estudar. Estava em casa, quando escutei o som da moto do meu pai a entrar no quintal, fiquei admirado, não era a hora do almoço e estava muito cedo. Entrou eufórico para a sala e com um sorriso no rosto me deu a notícia. Não estava a espera disto, por isso fiquei sem palavras. Essa notícia parecia pouco realístico para mim, mas conhecendo o meu pai, ele não é de se deitar conversa fora, principalmente com assuntos como este.
Passando alguns dias soube que não era o único aluno que tinha recebido a bolsa. Enquanto estava a pensar se aceitaria a bolsa ou não, muitos dos meus colegas já se encontravam em São Tomé a tratar dos seus documentos para a viagem. Demorei para dar a resposta. No início pensava que era medo da viagem, mas depois vim a perceber que não era esse tipo de medo, mas sim tinha medo era da distância, pois sabia que quanto maior a distância, maior é a saudade. E aceitar a bolsa significaria estar longe dos pais, dos amigos e da terra que eu amava. Após muito pensar e de receber conselhos da família acabei por aceitar. Não era fácil tomar uma decisão dessa sabendo que isto mudaria por completo a minha vida.
Sou santomense, nasci e cresci na ilha do Príncipe. Sou um príncipe sem coroa. Nesta ilha que chamamos o pulmão da África. Ali tudo é mais terra-terra. E é dessa proximidade que nos faz ser mais gente, mais humilde e de viver em conformidade com a natureza. Ali vivemos muitas vezes do que a natureza dá, levantamos cedo e vamos aos campos, cultivamos e cuidamos das nossas plantas. Dessa simplicidade da vida que até os deuses inveja. Uma terra abençoada, cheia de amor e de alegria. Onde os mais velhos procuram transmitir aos mais novos os seus conhecimentos e por isso as crianças aprendem a respeitar os mais velhos. As avós de uma é avós de todos, a mãe de uma é a mãe de todos. E assim vive-se no “leve-leve” da ilha do Príncipe.
No nosso último jantar em família a minha mãe preparou a minha comida preferida, estávamos todos felizes com a novidade, mas também sentia um pouco de receio. Os olhos da minha mãe brilhavam naquela noite de luar. Não era preciso palavra para saber o que lhe vinha a alma – do orgulho que tinha do seu filho, mas ao mesmo tempo, de uma tristeza, pois sabia que não o iria ver por um longo tempo. Naquela noite tudo brilhava e dançava ao ritmo da música. Apesar de estar feliz de estarmos todos juntos, sabia que isso não iria durar para sempre.